O pichiciego-menor mede pouco mais de 10 cm e vive de baixo da terra nas planícies da Argentina.
Da BBC

O raro pichiciego-menor é encontrado nas planícies da Argentina.
Foto: Mariella Superina/BBC


“Apesar do nome ‘pichiciego’, esses animais não são realmente cegos. Conseguem distinguir claridade de escuridão. ‘Pichi’ significa menino na língua mapuche (um povo indígena da região centro-sul do Chile e do sudoeste da Argentina), e eu suspeito que ‘ciego’ foi agregado ao nome para distingui-lo do piche (Zaedyus pichiy), uma espécie de tatu que pesa cerca de 1 kg e vive na mesma região”, disse a especialista.
Natureza delicada
Superina é pesquisadora do Conselho Nacional de Pesquisas Científicas e Técnicas (CONICET), na província de Mendoza, Argentina, a região do pichiciego. Por sua raridade, toda vez que as autoridades encontram um pichiciego perdido, eles o ajudam.
“Eles começaram a me avisar e a me trazer pichiciegos, primeiro um morto, depois um vivo para ver se eu conseguia reintegrá-lo a seu habitat natural e assim eu comecei a conhecê-los”, disse Superina à BBC Mundo. “O que acontece é que às vezes as pessoas o encontram, por exemplo, em uma estrada e, ou o levam pra casa como animal de estimação, ou o entregam às autoridades e perguntam o que é”, disse a especialista. Mas a melhor coisa a se fazer, segundo a especialista, é deixar o pichiciego seguir o seu caminho, levando em consideração sua natureza delicada.
Superina lamenta nunca ter visto um em seu habitat natural e teme que eles estejam à beira da extinção.
‘Eu realmente não sei quantos existem. Sou presidente do grupo de especialistas em tatus, preguiças e tamanduás da União Internacional para a Conservação da Natureza e não temos dados suficientes para dizer se os pichiciegos estão ameaçados ou não, simplesmente porque não há nenhum estudo prático’, diz Superina.
Refinado
O que o torna tão especial? Superina explica que, entre as 21 espécies de tatus, que já são muito diferentes de outros mamíferos, o pichiciego é o único que perdeu a parte lateral da carapaça. “Sob a carapaça estão pelos de seda que cobrem seu corpo e ajudam o pichiciego a manter sua temperatura corporal.”
“A ponta da cauda tem uma forma de diamante, que também é muito raro e é usada como uma quinta pata de apoio”, acrescenta a especialista.
Eles também têm uma placa vertical na parte de trás que os cientistas não sabiam o que era. Até que a pesquisadora foi capaz de colocar uma câmera infravermelha em um dos pichiciegos resgatados e filmá-lo. “Ele só saiu à noite, mas às vezes eu podia ver como ele cavava. Ele escavava e depois se virava e batia a terra atrás dele com esta placa vertical, um comportamento muito especial que os outros tatus não têm”.
Mas isso não é tudo: este tatu observado por Superina também se mostrou extremamente “exigente”. “A verdade é que eu fiquei louca, porque era extremamente difícil encontrar algo para ele comer, passei dias capturando besouros, à procura de vermes, procurando frutas naturais, para ver se conseguia incentivá-lo a comer algo natural, e nada, acho que tentei 34 ingredientes diferentes e ele se recusou a comer”, disse a pesquisadora.
“Então, eu tentei uma mistura de diferentes ingredientes, que foi o que ele comeu.” Mas, segundo Superina, qualquer alteração na mistura causou a rejeição imediata do pichiciego refinado.
“E o mais engraçado é que eu fiz a mesma mistura para o segundo pichiciego que me entregaram para reabilitar, e ele a rejeitou. Eles devem ter fortes preferências individuais, e por isso não podemos replicar estas experiências, e reabilitar cada pichiciego é um desafio muito grande”, explicou a especialista.